Transcrição de palestra dada por Ajahn Mudito em novembro 2021. Clique aqui para assistir a gravação original.
Um dos maiores problemas que as pessoas têm hoje em dia é sofrimento interior. As pessoas são fenômenos dolorosos, a existência delas é dolorosa. A pessoa mesmo não fazendo nada, a pessoa pode estar à toa em casa e aquilo já é doloroso. As pessoas sofrem, elas têm bastante aversão por si mesmas, tem bastante raiva de si mesmas, vergonha e insatisfação consigo mesmas etc. É uma mente doentia, uma mente doente. Uma pessoa normal, que é chamada normal hoje em dia, é um fenômeno não muito saudável. Isso reflete quando a pessoa vai praticar meditação. Ela tenta praticar meditação, mas não consegue suportar a experiência do silêncio, a experiência de estar consigo mesma sem distrações e de ter um olhar contínuo sobre si mesmo. As pessoas acham aquilo extremamente desagradável. Então isso gera essa agitação mental que deixa as pessoas queimando. A mente das pessoas queima e elas têm sempre essa agonia, esse impulso em tentar buscar prazeres para aliviar aquele sofrimento. Essa sede insaciável por distrações, por prazeres, por estímulos agradáveis, tudo isso ocorre graças a esse desconforto que as pessoas sentem interiormente. Isso é causado por várias frentes, várias coisas que acabam virando um sistema, um ciclo vicioso em que até mesmo essa busca por alívio acaba reforçando o sofrimento.
Tem várias coisas que contribuem para esse mal-estar: visão incorreta – ponto de vista incorreto. As pessoas entendem o mundo errado. Então elas têm atitudes erradas com relação ao mundo, com relação à vida, com relação a si mesmas, com relação à sociedade, com relação às demais pessoas, ao seu corpo e a sua mente, com relação ao passado, ao futuro e ao presente. Resumindo: tudo! (risos). Resumindo: as pessoas fazem tudo errado! As pessoas não sabem viver! Então, essa é uma questão do ponto de vista, de como as pessoas lidam com a vida delas.
Além disso, também tem o mal comportamento: as pessoas não têm noção, não há essa percepção de que aquilo que eu faço é importante. As pessoas só pensam: “Aquilo que eu faço é importante se tiver alguém olhando. Se ninguém está olhando eu posso fazer qualquer coisa porque não tem importância”. Não entendem como funciona o sistema de autoestima, elas mentem para si mesmas, acham que: “Ah, tudo bem, ninguém vai ficar sabendo, então isso não tem consequências”. Não entendem como é que a autoestima funciona, então elas agem de maneira que sabota a autoestima delas, elas mesmas não têm respeito ou admiração por si mesmas. Elas não sentem confiança em si mesmas, não têm admiração e sentem vergonha de si mesmas. Isso é outra fonte de dor e sofrimento, pois não conseguem agir de uma maneira limpa, honesta, que não traga vergonha ou arrependimento. E isso queima, queima as pessoas por dentro!
Além disso, tem a vaidade: as pessoas no mundo têm desejo por estímulos sensoriais, tem desejo por prazer. Se for falar em termos budistas chama-se: bhava-tanhā, vibhava-tanhā… tanhā… espera aí, não… qual é o terceiro?… como é que se fala em pali? Bom, mas de qualquer forma é desejo por sensações agradáveis, físicas. Tem desejo por ser, isso entra mais para o lado da vaidade. Tem desejo por ser, tem desejo por um eu fantástico, maravilhoso, agradável, poderoso, talentoso, simpático, rico, famoso, que todo mundo admira, “que todo mundo me inveja”, “todo mundo tem medo de mim” ou “tem respeito por mim”, etc, etc… “todo mundo gosta de mim”, depende, cada pessoa é diferente. Alguma pessoa fala: “Ah, eu quero que todo mundo tenha medo de mim, tenham respeito por mim”, outra pessoa não: “Eu quero que as pessoas gostem de mim”. Cada um tem sua loucura, né! Isso já entra dentro do espectro de vaidade. Então, o problema é quanto mais desejo por um eu fantasioso você tem, mais insatisfação com seu eu aqui agora você vai ter também. Isso é uma faca de dois gumes, a pessoa não percebe que naquele açúcar tem veneno misturado. Então elas ficam ali fantasiando como é que elas seriam: elas seriam famosas, elas seriam admiradas, “todo mundo ia gostar de mim”, “todo mundo ia me respeitar”, e isso e aquilo, mas no meio daquele prazer que ela sente em fantasiar sobre um eu perfeito vem junto o veneno da baixa autoestima. Quanto mais você sente atração por um eu perfeito, mais aversão você sente por um eu real aqui e agora, esse eu que já existe aqui e agora. Então isso vai envenenando a autoestima das pessoas, também! As pessoas que vivem cercadas de vaidade, obcecadas por vaidade são muito sofridas. Mesmo que elas tenham um corpo agradável, aquilo é um prazer que é que nem o prazer das drogas, é um prazer, mas é um prazer tenso, não é um prazer sereno e relaxado. Enquanto ela está drogada ela sente prazer, mas nunca relaxa, tem sempre uma tensão e um medo envolvido, porque logo em seguida esse prazer vai passar. É um prazer artificial que tem que ser sustido, é um trabalho para suster aquilo! Então os prazeres da vaidade é a mesma coisa. É um prazer artificial e por ser um prazer artificial sempre tem um medo forrando aquele prazer, tem um chão de medo, tensão e preocupação. É um prazer tenso, um prazer frágil. Outro ponto é esse, as pessoas são seduzidas pela vaidade e aí a vaidade vem junto com abaixa autoestima. São dois lados da mesma moeda. Então é uma coisa curiosa, as pessoas que são muito vaidosas têm muito baixa autoestima. As pessoas com muito baixa autoestima são extremamente vaidosas, mas elas não expressam essa vaidade da maneira que a gente está acostumado a enxergar. Não é em roupa, em cabelo, em carro, em fama, essa vaidade se expressa de uma maneira diferente, às vezes é assim: “Ah, eu sou a pior pessoa do mundo!”, “Ah eu sou horrível!” , “Não, ninguém é tão ruim quanto eu!”, essa é outra forma de vaidade. As pessoas pensam: “Eu sou especial”, porque se a pessoa não consegue ser especial de forma positiva, ela quer ser especial de forma negativa, mas ser normal, não! Isso em hipótese alguma! É preciso ser especial. Geralmente uma pessoa quando é criança só recebeu atenção do pai e da mãe quando fez algo errado, aquilo fica gravado na mente dela: “Ah, para eu receber atenção eu preciso ser ruim!”. A pessoa fica num vício nesse tipo de mentalidade, não passa nunca! As pessoas morrem enfiadas nesse buraco e não conseguem sair. Então, as pessoas que têm muito baixa autoestima têm muita vaidade, as pessoas que têm muita vaidade têm muito baixa autoestima. Só que está escondido, ambos estão escondidos.
Visão incorreta… a visão incorreta se chama micchā-ditthi.
Kāma-tanhā! Ah, lembrei: kāma-tanhā, bhava-tanhā, vibhava-tanhā! O segundo seria bhava-tanhā, que se expressa na forma de vaidade, nesse exemplo que estou dando. Bhava-tanhā vai um pouco mais longe do que isso, mas nesse caso se expressa na forma de vaidade.
E aí vem junto vibhava-tanhā, é a aversão, é o não querer que as coisas sejam. Então, esse é outro ponto de sofrimento das pessoas. Elas se recusam a fazer as pazes com o ambiente ao redor delas, elas querem que seja assim, não querem que seja daquele outro jeito. Então fica sempre queimando ali, querendo que o mundo seja feito do jeito que não é. Por exemplo, as pessoas não querem envelhecer, não querem ficar feias, não querem que a pele fique flácida, não querem que os músculos fiquem fracos, que os olhos fiquem turvos, que a saúde decaia, que as pessoas queridas morram, que as pessoas queridas mudem: antigamente as pessoas eram assim, agora já não são mais daquele jeito. As pessoas não querem isso, sentem aversão. Então isso é vibhava-tanhā, elas têm aversão à realidade, ao que é. Outra fonte de sofrimento!
Kāma-tanhā que é desejo por prazeres. Todos eles na verdade acabam virando um ciclo vicioso, mas kāma-tanhā é o mais óbvio, é o ciclo vicioso mais óbvio. Porque nele mesmo já está o sofrimento. Todos eles são assim, mas kāma-tanhā é o desejo por prazeres sensoriais, é tão óbvio! Como ele é não se sustem! O mais característico desses, porque como é algo que requer o corpo físico – o estímulo físico é extremamente efêmero – não se sustem! Você sente prazer durante alguns segundos, às vezes, alguns minutos, por exemplo: comer uma refeição agradável não é um prazer assim, estável. Você sente aquele prazer e passa, se distrai, fala aquilo, sente prazer e passa. Conforme você começa a mastigar, já some aquele prazer, já vira uma coisa desagradável, uma massa suja na sua boca e tal… É um prazer assim muito efêmero. E mesmo que seja um prazer que se sustenha, por exemplo: um cheiro agradável. Quanto tempo você consegue sentir prazer por aquilo? Depois de alguns minutos aquilo fica indiferente… já não tem mais.. não se sustem! Prazeres sexuais, prazeres do paladar, prazer do olfato, prazer da música. A música é outra também! Quantas vezes você consegue ouvir a mesma música sem ficar entediado? E logo depois de ficar entediado, fica irritado! Aquela música era super agradável agora irrita, causa sofrimento. Então é um prazer que não se sustem. Aí o que as pessoas fazem é ficar trocando, ficam rodando, tentando prazer aqui, aqui, aqui e aqui. Ficam rodando entre prazeres o tempo todo, nesta queimação constante. Tentando variar o estímulo, tentando mudar o estímulo, um novo estímulo, buscar um novo estímulo. No final as pessoas acabam fazendo cada coisa esquisita para tentar algum…, como se fosse uma pessoa que está ficando surda e cada vez tem que fazer um barulho mais alto para conseguir ouvir, vai aumentando o volume porque vai perdendo a capacidade de ouvir. Só que conforme aumenta o volume ela fica mais surda ainda. É um ciclo vicioso, dessa mesma forma. As pessoas que buscam satisfação em prazeres sensuais é a mesma coisa, elas ficam buscando estímulos cada vez mais fortes. E cada vez que elas conseguem um estímulo mais forte, mais elas ficam incapacitadas de sentir prazer. É exatamente como aquele contrato com o demônio que tem na cultura… com é que chama… no folclore. É exatamente um contrato com o diabo, você é enganado pelo seu próprio prazer. Aquilo que você busca destrói a sua capacidade de experienciar o que você queria. Então, prazer sensual…
E comportamento também. Todos eles na verdade não têm uma divisória exata entre esses diferentes fatores que eu estou falando. Em todos eles funciona um sistema bastante hermético. Então é uma coisa que se fecha em um sistema e a pessoa fica presa ali dentro, rodando, mas uma das consequências de tudo isso e também uma causa de sofrimento é justamente o mau comportamento. As pessoas se comportam movidas por desejo por prazeres sensuais, movidas por vaidade, movidas por aversão ao que é aqui e agora, movidas por compreensão incorreta do que é o quê. As pessoas agem mal, elas tomam más ações. A mente delas as engana a agir de maneira estúpida, de maneira ridícula, de maneira patética, de maneira retardada, de maneira ruim, e aí elas se queimam. Quando chega no nível físico, é como se assinasse um contrato, porque tem consequências, as pessoas notam. Enquanto é algo só na sua mente, só na sua imaginação, ainda você consegue sair fora rápido porque não tem uma expressão, as pessoas não viram, ninguém viu, ninguém sabe. Se você mudar de ideia ninguém ficou sabendo, tudo bem, né? Então você consegue largar mais facilmente, mas os atos que você realmente comete, que você faz com seu corpo, que você faz com sua fala, tem as testemunhas. Então, mesmo que você entenda que o que você fez foi errado, e você se arrependa daquilo, ainda tem as pessoas que lembram do que você fez, que vão te cobrar pelo que você fez, que vão te criticar pelo que você fez, vão ter uma atitude ruim com relação a você, por causa dos seus atos. Então é uma coisa que perdura de uma maneira muito mais agressiva. É uma coisa muito mais grosseira. Então, o Buda ensinava as pessoas sobre a urgência de botar um estanque neste tipo de ação, ação corporal, ação verbal. Quem consegue ter um pouco de autocontrole, seria bom que as pessoas levassem a sério esses cinco preceitos, porque realmente resultam em bem-estar. As pessoas acham que a contenção, conter as suas ações é sinônimo de sofrimento, porque elas enxergam do ponto de vista dos desejos. Se perguntar para um desejo: “Desejo, o que você acha disso aqui?”, resposta: “Ah, isso aí é sofrimento, óbvio!”. Da mesma forma, se você perguntar para a preguiça: “Dona preguiça, o que você acha de fazer esse trabalho aqui?”, a preguiça responde: “Oh, esse trabalho é horrível, medonho!”. Agora, se você perguntar para a diligência: “Ô diligência, o que você acha de fazer esse trabalho aqui?”, “Opa, esse trabalho vai ser bacana, vamos fazer que vai ser legal!”. Se perguntar para a moralidade, para honestidade, para a compaixão, para o bem-querer. Perguntar para o bem-querer: “O que você acha da gente restringir as nossas ações, ter mais contenção no que a gente faz ou não?”, resposta: “Opa, parabéns, muito bom, assim a gente para de agredir as pessoas”. Então, a honestidade, o bem-querer, todas essas coisas vão elogiar você ter contenção nos seus atos. Você ter atos disciplinados, disciplina em como você se comporta, no que você fala. O que motiva sua disciplina pode ser mil coisas diferentes, pode ser respeito pelas demais pessoas, pode ser compaixão pelas demais pessoas, pode ser respeito por si mesmo. Você fala: “Eu quero ser uma pessoa nobre, isso não é digno de mim, me comportar de uma maneira tão baixa! Eu mereço melhor do que isso, eu mereço fazer algo bom para mim mesmo, eu não vou agir e falar de maneira baixa e suja. Falar dessa maneira baixa e suja!”. Então, por exemplo, às vezes você não briga com as pessoas, você nem entra em bate-boca nem por compaixão àquela pessoa, nem é questão de compaixão, a questão é a seguinte: você não merece! Você pensa: “Você não merece o meu bem-estar. Eu não vou me sujar com isso para induzir você nessa brincadeirinha assim de ficar gritando, você grita eu grito. Vai brincar sozinho! Eu não estou interessado, eu tenho mais o que fazer com minha vida. Eu valho mais do que isso!” Então, às vezes é até uma autoestima, um senso de valor em si mesmo que vai impulsionar o seu comportamento moral. Só não faça isso com… em último caso você pode fazer até por medo também, ter medo de más ações, medo de cair no inferno, medo de isso… do karma, mas não é o mais ideal. O ideal seria uma coisa positiva, porque senão é uma coisa tensa e supersticiosa. Seria melhor que você tivesse uma coisa mais clara e racional, uma coisa fácil de se relacionar aqui e agora, com inteligência. E uma emoção positiva, não uma emoção negativa. Mesmo que for uma emoção negativa ainda assim você consegue controlar o seu comportamento, o que não é ruim. Evitar cometer maus atos é bom, mas é uma coisa ineficiente e gera tensão (usar emoções negativas para isso), e fica uma coisa não muito inteligente. Seria melhor se você conseguisse fazer as coisas de uma maneira mais inteligente, e motivado por uma boa intenção, uma intenção saudável e agradável, algo bom, algo que alimente o coração. Assim você mata dois coelhos com uma cajadada só! Você tanto limpa o seu comportamento, constrói uma boa fundação de bom karma; como também nutre a mente, deixa a mente saudável, deixa a mente feliz, deixa a mente energética, saudável. Deixa a mente saudável… Gera autoestima, gera bem-querer por si mesmo. É muito mais proveitoso você fazer desta forma do que fazer através de repressão, medo, raiva e vergonha etc. Vergonha e medo deveriam ser só em caso de emergência. Em uma situação muito séria, se o bem-querer e a autoestima não chegaram junto, aí o medo tem que segurar a bronca como se fosse uma rede de segurança. Quando nada mais segurou, aí o medo vai lá e segura: “Não faça isso, porque isso é mau karma, isso é ruim!”. Ter medo das consequências: “Alguém vai ficar sabendo, alguém vai me criticar, alguém isso…”. Então o medo seguro a bronca, mas o ideal é que isso seja um recurso em último caso, em último caso você tem essa rede de segurança.
O ideal é fazer as coisas por inteligência, por bem-querer, por compaixão, por autoestima, por respeito: qualidades nobres! E aí gerando mais bem-estar você fica cada vez menos aversivo, quanto mais você tem bem-estar dentro de si, mais capaz de tolerar aquilo que não é agradável no mundo você fica. A questão de vibhava-tanhā começa a diminuir um pouco. E quanto mais bem-estar você tem dentro de si mesmo, mais fraco fica este impulso desesperado em buscar prazeres fora de si. Então kāma-tanhā abranda. E quanto mais bem-estar você tem dentro de si mesmo, e esse bem-estar vem dessas boas qualidades da mente, menos necessidade de vaidade, de exibição de vaidade que depende da opinião alheia você tem. Então bhava-tanhā também se abranda, fica mais tranquila, você tem autoestima. Quem tem autoestima não precisa de vaidade, a vaidade não cumpre… não é necessária, é dispensável para quem tem autoestima. E tendo esse bem-estar, bhava-tanhā abrandando, vibhava-tanhā ficando mais fraca, kāma-tanhā se enfraquecendo, a mente sente ainda mais bem-estar. E a mente sentindo ainda mais bem-estar, ela sente ainda menos esse sofrimento. E eventualmente ela começa a experienciar, bem claramente, paz. A mente fica tranquila, fica um fenômeno sereno e tranquilo, agradável, uma coisa suave e harmoniosa. Quando a mente é assim ela tem a característica da clareza. Ela enxerga claramente sem aquela bagunça toda de queimação constante: medo, ansiedade, ganância, preocupação. Sem isso queimando, as coisas são bastante óbvias. Você olha ao redor e pensa: “Ah, é isso! É óbvio!”. Aquilo era tudo complicado por causa dessa bagunça que é a mente das pessoas. Quando a mente se abranda, fica tranquila, é tudo bastante óbvio, não tem nada de mais no mundo, não tem mistério. Era para isso ser fácil, gente! É tudo tão óbvio! O que é incrível é o tamanho da cegueira das pessoas. O mundo em si é um negócio bem tranquilo, as pessoas é que são esquisitas. Com a mente clara, o problema de micchā-ditthi também se abranda porque a pessoa começa a enxergar claramente, então, ela começar a ter a atitude correta com relação ao mundo, o ponto de vista dela fica correto, o ponto de vista dela sobre o que é o quê naturalmente fica alinhado com a verdade. Então, micchā-ditthi também se abranda naturalmente, e micchā-ditthi se abrandando, a mente fica ainda mais tranquila porque ela entende o mundo, quando ela entende o mundo aquilo em si já gera bem-estar, apazigua aquela queimação. Entendendo o mundo, a pessoa age de maneira correta. Então ela não comete mais essas gafes medonhas, essas burrices absurdas que a gente comete no dia a dia, essas coisas ridículas que a gente faz no dia a dia achando que está sendo esperto. Então as pessoas não fazem mais esse tipo de besteira. Como eu falei, tem o ciclo que leva a pessoa para baixo, tem um ciclo que faz as pessoas ficarem cada vez piores; mas também tem o ciclo reverso, tem o ciclo que faz as pessoas ficarem cada vez melhores. É uma coisa que pega embalo e vai rodando sozinha, é uma coisa que chega uma hora que fica bem agradável.
Por isso, que talvez, essa seja uma diferença crucial entre Budismo e Cristianismo. Essa ideia de que bondade é sinônimo de sacrifício e sofrimento… nunca! No Budismo jamais isso é verdade! Na verdade, se você fizer bem-feito, a bondade fica um negócio natural e tranquilo. Quando você está trocando de um pé para o outro tem esse período de atrito, até você conseguir virar esse jogo, mas quando você vira o jogo, é a coisa mais agradável que existe, muito mais agradável que o ciclo dos prazeres sensuais. É muito mais agradável que o ciclo da vaidade, o ciclo da loucura que as pessoas fazem. Dentro do Budismo essa ideia é totalmente falsa, não existe isso. Na verdade, se olhar com atenção, se perguntar para uma pessoa inteligente dentro do Cristianismo ela também vai explicar que não, não é assim que isso funciona, isso é uma visão incorreta do que é. Na verdade a bondade leva a felicidade, mas não é a felicidade dos prazeres sensuais, não é a felicidade mundana; mas existe essa compreensão de que boa pessoa é a pessoa que sofre e sacrifica, algumas pessoas entendem assim, mas não é bem isso não.